Há "amêndoas" que amargam tanto...tanto...
Miguel e a Teresa reconciliaram-se.
Esta era a notícia do dia que a Joana, o melhor meio de comunicação desde a portaria ao arquivo, se esforçava por dar a conhecer a todos os colegas do escritório. Baixo, muito baixinho, dizia-o entre dentes, não fossem os visados ouvir. A bombástica notícia apanhou desprevenidas todas aquelas pessoas que adoram estar a par da vida alheia. «-Como é que é possível?», «- Ela não tem vergonha nenhuma na cara», «-Ele é um grande banana», «-Só o fizeram por causa das miúdas» eram os mimos que se ouviam nos corredores. Todo aquele interesse mesquinho de opinar e participar no fórum da maledicência só se justifica pela pitada de sal que aquilo trazia às suas patéticas vidas.
Mais tarde, mumificada na IC19, o Miguel e a Teresa passearam pelo meu pensamento, tão lentamente como o trânsito naquele fim de tarde. Conheceram-se na adolescência numa daquelas festas de garagem onde às escondidas se fumava SG Ventil, bebia Super Bock e se trocavam os primeiro beijos. Sobreviveram à distância imposta pela faculdade, ela no Porto, ele em Lisboa, casaram assim que terminaram o curso, arrastaram-se pelo escritório com os sinais de desgaste com nascimento das gémeas, lutaram lado a lado com as dívidas à banca que Miguel contraiu, mas não sobreviveram ao desfalecer da paixão, à presença da rotina. Os anos que se seguiram, assistiram à batalha campal do divórcio. Se este casal pertencesse ao Jet Set teriam feito correr rios de tinta nas páginas das revistas cor-de-rosa, mas não pertenciam, situavam-se apenas num universo, que é dito como normal, e a que cada um de nós está longe de dizer que jamais irá pertencer. Como amiga do casal dei comigo no meio dos desabafos e agressões. O objectivo era ver quem é que feria mais o outro, quem é que denegria mais a imagem do ex companheiro. Ela acusava-o de ser preguiçoso e de ter arruinado o património da família com os seus gostos de novo rico, ele retribuía o galhardete dizendo que ela estoirava o dinheiro em roupa e em clínicas de estética para minimizar os estragos que fazia à mesa; ela dizia que ele passava as noites no sofá ou na cama a ressonar, ele dizia que ela passava a noite a ver telenovelas e que chegava à cama sempre com dores de cabeça; ela censurava-o por ser egoísta e não lhe dar prazer, ele desprezava-a dizendo que era frígida; ela queria o Chalé de Andorra, a casa na Quinta do Lago e o descapotável, ele respondia que a tirou da miséria e que ia sair de casa com a roupa adquirida na feira de Carcavelos que trazia no dia em que a conheceu; ela queria a custódia das filhas e uma pensão milionária, ele disse que não tinha tempo para cuidar das gémeas e dava-lhe uma pensão irrisória.
Quando finalmente declararam tréguas um ao outro ele passou a sair com todas as mulheres maduras que o fascinavam, ela fez uma ronda pelos sub 21 que encontrava nas saturday nigth fever. Afastaram-se e construíram novos caminhos para as suas vidas. Cinco anos passaram, as gémeas tornaram-se um pretexto para a aproximação. Havia sempre uma prova de natação ou um torneio de basquetebol e, primeiro com algum desconforto, depois com uma clara alegria, começaram a sentar-se lado a lado nas bancadas do clube desportivo onde gritavam e torciam pelas filhas. Pelo canto do olho, Miguel olhava Teresa e pensava que o divórcio só lhe fizera bem. Estava mais magra, mais bonita, vestia-se com maior elegância. Teresa sentia o olhar dele sobre o seu corpo e também lhe reconhecia os benefícios da separação: músculos mais firmes esculpidos pelas corridas matinais no parque da cidade, o cabelo mais curto e pincelado por uns laivos grisalhos, a roupa desportiva que lhe dava um ar menos formal.
Miguel e Teresa… sorrio. Voltam aos meus ouvidos os mexericos do escritório nesta manhã. Ao contrário do que dizem, esta relação tem tudo para dar certo. Não é só pelo facto de reconhecerem, depois de tudo o que viveram, que ainda se amam, mas é o facto do que aprenderam longe um do outro e o que cresceram como pessoas, que lhes vai permitir construir uma relação nova. Ele aprendeu a trocar o jornal pela actividade física, a substituir a vaidade e o exibicionismo de um carro novo pela tranquilidade de um fim-de-semana a dois perdidos num SPA; ela deixou a televisão e foi esculpir o corpo no ginásio, tomou aspirinas quando tinha realmente dores de cabeça e entregou-se sem pudor ao prazer na cama com o marido. Mas o que me leva a acreditar novamente naqueles dois é o facto de se conhecerem muito bem. Miguel e Teresa reconhecem no outro, os seus valores, as suas qualidades, mas melhor que isso, conhecem-se do avesso, o lado lunar, o que de pior têm para oferecer.
O ódio e o amor são sentimentos próximos, um casal que já se amou e que se odiou de seguida, tem fortes probabilidades de ser feliz, quando se voltar a amar.
Esta era a notícia do dia que a Joana, o melhor meio de comunicação desde a portaria ao arquivo, se esforçava por dar a conhecer a todos os colegas do escritório. Baixo, muito baixinho, dizia-o entre dentes, não fossem os visados ouvir. A bombástica notícia apanhou desprevenidas todas aquelas pessoas que adoram estar a par da vida alheia. «-Como é que é possível?», «- Ela não tem vergonha nenhuma na cara», «-Ele é um grande banana», «-Só o fizeram por causa das miúdas» eram os mimos que se ouviam nos corredores. Todo aquele interesse mesquinho de opinar e participar no fórum da maledicência só se justifica pela pitada de sal que aquilo trazia às suas patéticas vidas.
Mais tarde, mumificada na IC19, o Miguel e a Teresa passearam pelo meu pensamento, tão lentamente como o trânsito naquele fim de tarde. Conheceram-se na adolescência numa daquelas festas de garagem onde às escondidas se fumava SG Ventil, bebia Super Bock e se trocavam os primeiro beijos. Sobreviveram à distância imposta pela faculdade, ela no Porto, ele em Lisboa, casaram assim que terminaram o curso, arrastaram-se pelo escritório com os sinais de desgaste com nascimento das gémeas, lutaram lado a lado com as dívidas à banca que Miguel contraiu, mas não sobreviveram ao desfalecer da paixão, à presença da rotina. Os anos que se seguiram, assistiram à batalha campal do divórcio. Se este casal pertencesse ao Jet Set teriam feito correr rios de tinta nas páginas das revistas cor-de-rosa, mas não pertenciam, situavam-se apenas num universo, que é dito como normal, e a que cada um de nós está longe de dizer que jamais irá pertencer. Como amiga do casal dei comigo no meio dos desabafos e agressões. O objectivo era ver quem é que feria mais o outro, quem é que denegria mais a imagem do ex companheiro. Ela acusava-o de ser preguiçoso e de ter arruinado o património da família com os seus gostos de novo rico, ele retribuía o galhardete dizendo que ela estoirava o dinheiro em roupa e em clínicas de estética para minimizar os estragos que fazia à mesa; ela dizia que ele passava as noites no sofá ou na cama a ressonar, ele dizia que ela passava a noite a ver telenovelas e que chegava à cama sempre com dores de cabeça; ela censurava-o por ser egoísta e não lhe dar prazer, ele desprezava-a dizendo que era frígida; ela queria o Chalé de Andorra, a casa na Quinta do Lago e o descapotável, ele respondia que a tirou da miséria e que ia sair de casa com a roupa adquirida na feira de Carcavelos que trazia no dia em que a conheceu; ela queria a custódia das filhas e uma pensão milionária, ele disse que não tinha tempo para cuidar das gémeas e dava-lhe uma pensão irrisória.
Quando finalmente declararam tréguas um ao outro ele passou a sair com todas as mulheres maduras que o fascinavam, ela fez uma ronda pelos sub 21 que encontrava nas saturday nigth fever. Afastaram-se e construíram novos caminhos para as suas vidas. Cinco anos passaram, as gémeas tornaram-se um pretexto para a aproximação. Havia sempre uma prova de natação ou um torneio de basquetebol e, primeiro com algum desconforto, depois com uma clara alegria, começaram a sentar-se lado a lado nas bancadas do clube desportivo onde gritavam e torciam pelas filhas. Pelo canto do olho, Miguel olhava Teresa e pensava que o divórcio só lhe fizera bem. Estava mais magra, mais bonita, vestia-se com maior elegância. Teresa sentia o olhar dele sobre o seu corpo e também lhe reconhecia os benefícios da separação: músculos mais firmes esculpidos pelas corridas matinais no parque da cidade, o cabelo mais curto e pincelado por uns laivos grisalhos, a roupa desportiva que lhe dava um ar menos formal.
Miguel e Teresa… sorrio. Voltam aos meus ouvidos os mexericos do escritório nesta manhã. Ao contrário do que dizem, esta relação tem tudo para dar certo. Não é só pelo facto de reconhecerem, depois de tudo o que viveram, que ainda se amam, mas é o facto do que aprenderam longe um do outro e o que cresceram como pessoas, que lhes vai permitir construir uma relação nova. Ele aprendeu a trocar o jornal pela actividade física, a substituir a vaidade e o exibicionismo de um carro novo pela tranquilidade de um fim-de-semana a dois perdidos num SPA; ela deixou a televisão e foi esculpir o corpo no ginásio, tomou aspirinas quando tinha realmente dores de cabeça e entregou-se sem pudor ao prazer na cama com o marido. Mas o que me leva a acreditar novamente naqueles dois é o facto de se conhecerem muito bem. Miguel e Teresa reconhecem no outro, os seus valores, as suas qualidades, mas melhor que isso, conhecem-se do avesso, o lado lunar, o que de pior têm para oferecer.
O ódio e o amor são sentimentos próximos, um casal que já se amou e que se odiou de seguida, tem fortes probabilidades de ser feliz, quando se voltar a amar.
publicado por ssb em http://aspalavrasnuncatedirei.blogs.sapo.pt/
1 comentário:
Quando se cai e que faz doer aprende-se que na proxima passagem se deve ter mais cuidado.
Com o tempo, trilhos e carreiros passam a ser caminhos por onde gostamos de passear mais pausadamente...
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